TEXTO
"The
Observer", que vem a ser a edição dominical do "Guardian",
publicou belo editorial sobre as drogas. Suas duas primeiras frases bastam para
definir todo o espírito da coisa: "Em junho de 1971, o presidente
norte-americano Richard Nixon declarou uma guerra às drogas. As drogas
ganharam".
(...) Que
a guerra foi perdida parece evidente. A tese é reforçada, no
"Observer", em artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que
basicamente reproduz a argumentação da comissão que ele integra ao lado de dois
outros ex-presidentes (o colombiano César Gavíria e o mexicano Ernesto
Zedillo).
Assim:
"Depois de décadas de sobre-vôos, interdições e ataques às fábricas de
drogas na selva, a América Latina permanece o maior exportador mundial de
cocaína e maconha. Está produzindo mais e mais ópio e heroína. Está
desenvolvendo a capacidade de produzir drogas sintéticas em massa".
Fica
claro, pois, que o enfoque militar/policial não produz resultados
significativos - ou, pior, só tornou mais grave o problema.
Para
complicar as coisas, há o fato de que toda a legislação internacional que
buscou fornecer o marco legal para controlar as drogas tem um século de vida
(desde a Comissão sobre o Ópio de Xangai, de 1909). O documento mais recente e
mais abrangente, a Convenção Única sobre Estupefacientes, já vai fazer meio
século (é de 1961).
É
natural, nesse cenário, que cresçam as vozes propondo a legalização das drogas,
tão audíveis como as que insistem no proibicionismo.
(...)
Reforça, em recente artigo para a Folha de S. Paulo, o dinamarquês Bo
Mathiasen, representante para o Brasil e o Cone Sul do Escritório das Nações
Unidas sobre Drogas e Crime:
"A
aparente contradição entre legalização ou não legalização tende a tirar a
discussão do foco realmente fundamental e que, em última análise, revela muito
mais convergências do que divergências: a busca por uma abordagem equilibrada
entre as ações de prevenção, de tratamento e de repressão ao crime
organizado".
Tokatlian
é mais específico: "O razoável é colocar a discussão em termos do
estabelecimento de regimes regulatórios modulados. Regimes porque devem cobrir
o amplo espectro de atividades e fases do fenômeno da droga (desde a demanda
até a oferta, além de outros componentes direta e indiretamente ligados ao
fenômeno).
Regulatório
porque se requer uma forte intervenção dos Estados em geral, para fixar as
regras, os procedimentos, os mecanismos e as normas para lidar melhor com essa
questão. E modulado porque é preciso desagregar cada droga de acordo com seu
prejuízo ou perigo e estabelecer o regime regulatório específico, em vez de
genérico como se se tratasse de produtos idênticos".
De fato,
há uma desproporção colossal entre usuários de cocaína e de maconha, de acordo
com os dados apresentados em "Nueva Sociedad" pela pesquisadora
chilena Lucía Dammert: seriam 165 milhões os consumidores de maconha no mundo
todo, 10 vezes mais que os 16 milhões que usam cocaína. Vinte e quatro milhões
consomem anfetaminas.
Luiz
Eduardo Soares, que foi secretário nacional de Segurança, no início do primeiro
governo Lula, apresenta outros números, sempre em "Nueva Sociedad",
sobre a diferença de riscos para a vida envolvidos na questão das drogas.
Informa que, no Rio de Janeiro, morrem por ano menos de 100 pessoas por consumo
excessivo de cocaína.
Mas cerca
de 65% dos mais de 6 mil crimes letais que ocorrem todos os anos no Estado
"têm relação direta ou indireta com o tráfico de drogas". Dá,
portanto, 4 mil mortes/ano pela violência associada ao narcotráfico.
Parece
evidente, pois, que o ponto principal do debate está voltado para a violência
relacionada ao tráfico, por sua vez associada ao proibicionismo, como acreditam
os defensores da legalização
"Nosso
problema não são as drogas; é o tráfico - e só existe por causa da
penalização", acha Luiz Eduardo Soares.
A tese é
tentadora, admito. Mas o texto de Lucía Dammert apresenta uma comparação que
abalou minha crença nela: no mundo todo, os mortos por uso de drogas são 200
mil. As vítimas do tabaco - legalizado há muito tempo- são cinco milhões ou 25
vezes mais.
Legalizar
as drogas, como é legalizado o tabaco (e, de quebra, o álcool), não levaria a
uma explosão de consumo?
Se a
guerra está perdida, parece longe, no entanto, o desenho de uma estratégia
capaz de recuperar a iniciativa e vencê-la.
Clóvis Rossi. 07/09/2009. http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/clovisrossi/ult10116u620386.shtml
Refletindo sobre aspectos como os
acima sugeridos, escolhendo entre eles os que você julgue mais pertinentes,
redija uma DISSERTAÇÃO-ARGUMENTATIVA,
baseando-se à posição do jornal quanto a esse
problema e à proposta de descriminalização de algumas drogas. Mobilize
argumentos que sustentem o seu ponto de vista, sobre esse posicionamento.
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