sexta-feira, 11 de março de 2011

Redações acima da média UNICAMP

Alunos, vejam algumas redações acima da média no vestibular de 1999/UNICAMP,  e façam suas comparações!


Tema A / Vestibular Unicamp 99:   500 anos de Brasil 


Nome:   ABDSANDRYK CUNHA DE SOUZA 
Cidade: GOIÂNIA-GO 
Candidato ao curso (1ª opção) de: ENGENHARIA ELÉTRICA (D) 

Enterrando o passado 
         Às margens do ano 2000, o Brasil começa a voltar suas atenções para a comemoração de seus 500 anos de descobrimento, mesmo que recentemente pesquisas revelem equívocos históricos que comprometeriam a precisão de tal momento. A evidenciação do fato inspira nos mais críticos um momento de reflexão, notadamente iniciado na análise histórica que remete uma explicação para a atual situação do país. 
         A volta ao passado evidencia uma visão histórica depreciativa pois o enfoque é dado pela visão do europeu, que por vezes retrata tendenciosamente fatos indispensáveis à compreensão da realidade. Livros revelam navegadores como heróis, nações européias mitificadas, uma postura contemplativa por um lado, mas distorce a imagem do novo mundo. Nesse princípio fica clara uma concepção capitalista, a oposição entre o rico e o pobre, o poder e a miséria, característicos do cenário de dominação. 
         Dessa forma, o Brasil foi colocado de forma marginalizada, uma postura negativa que empobreceu os valores racionais. Não há quem contemple a riqueza natural, sem ressaltar a pobreza espiritual daqueles que vivem e administram esse país. A visão dos historiadores foi uma herança que entrou na cultura do povo, infelizmente. Desde o princípio fixou-se uma imagem de terra explorada, quintal do mundo desenvolvido, isto é, o Brasil é o mundo subdesenvolvido. 
-Para completar essa classificação, ou melhor, essa rotulação, inseriram nas relações passadas o bom colonizador, aquele que trouxe a religião, o ensino, uma maneira de desbrutalizar o povo americano. Assim, asseguraram mais uma vez a superioridade do europeu, agora benevolente. 
         Nota-se claramente que sempre predominou uma análise que jamais revelaria um momento de comemoração. O brasileiro não consegue somar à sua postura de vida os valores nacionalistas. O único orgulho do povo é o esporte, pelo menos evidenciado a âmbito nacional. Isso fica claro quando comparamos o aniversário da Independência do Brasil com os jogos de copa do mundo. Politicamente essa é a atual visão do povo, e economicamente, o státus que desfruta o país leva a mais uma decepção. A herança colonial perdurou inclusive no aspecto social, pois ainda dividimos a sociedade de acordo com os preceitos do passado, inclusive etnicamente, estruturada nas grandes diferenças de classes. 
          A triste concepção de desenvolvimento jamais buscou, porém, elevar os valores, inclusive históricos, do povo brasileiro. Na visão ufanista talvez, ainda possamos encontrar a luta que envolveu a conquista do título de nação, a singular busca de autonomia e respeito, a excêntrica cultura nacional, a mesma que há muito vem sendo marginalizada pela postura de subordinação nacional. Infelizmente, ao pensarmos desta forma surge a crítica destrutiva, a desvalorização daqueles que buscam fugir do passado presente na conduta do povo que compõe o Brasil atual. 
          O materialismo capitalista destruiu o passado, destruiu muitas das riquezas do país, o índio, a mata, o povo. Na atual mistura de raças, não se reconhece o indivíduo capaz de valorizar e engrandecer o país. Deve-se lembrar que o país, essa nação, enfrentou situações terríveis, e por estar na atual situação, venceu. O potencial é enorme, basta que este povo seja o primeiro a coletivamente perceber isso e lutar por fazer de tais riquezas um bem ao país, e não aos que destruíram muito da fertilidade desta nação. Somos hoje uma semente, livre, que pode fazer do futuro um motivo de comemoração. 


Nome:   ALESSANDRA DE ANDRADE RIBEIRO 
Cidade: RIBEIRÃO PRETO-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: CIÊNCIAS SOCIAIS (D) 
 
500 anos de colônia   
          Ao estudarmos nossa história, desde seu descobrimento até os dias de hoje, depreendemos que, em muitos aspectos o Brasil mudou, mas em outros pontos essenciais ele continua o mesmo. 
          Antes haviam grupos indígenas e seus rituais próprios de iniciação, escravos negros e carroças. Hoje há Carla Peres para todos, proletários morenos, carros importados. Sim, houve mudanças, como vemos claramente, de uma cultura variada, ou várias culturas, para a cultura de nossa massa, da tecnologia precária das caravelas para a tecnologia de ponta dos clones. 
          Voltemos ao descobrimento. Este foi realizado já no início do desenvolvimento do sistema capitalista, durante o denominado Mercantilismo. A intenção das navegações que corriam nesta época era de conquistar novas terras para obter matérias-primas, novos mercados, capturar a riqueza das novas terras, ampliar o império dos colonizadores e realizar comércio. O discurso pregado desta época para justificar estas ações era o religioso, colonizar e catequisar para salvar almas. Fez-se, então, no Brasil e nas Américas, o etinocídio e o genocídio de índios em nome destas bandeiras, porém, sempre com intenções financeiras e de hegemonia como base e estimulante. 
          Durante a Monarquia havia um rei e sua corte muitos a serem comandados e dominados por seu poder e autoridade. Hoje há a República e a Democracia como regimes políticos, um presidente e uma minoria da elite possuidora de grande parte do capital produzido e da cultura desenvolvida, por um lado. Por outro, continua havendo uma grande maioria que é dominada e comandada, com, ainda, pouquíssimos recursos financeiros,  ? e raras são as excessões ? intelectuais e culturais. Vemos, portanto, que nem tudo mudou, apesar das mudanças ocorridas. 
         Mas, se por quinhentos anos vemos esta mesma situação, de disparidades sociais e dominação, por que, afinal, com tantas mudanças estes aspectos, em seu âmago, ainda continuam os mesmos? Sim, podemos ver que houve revolta na tentativa de mudanças mais profundas, como a Inconfidência Mineira e os movimentos estudantis da déc. de 60, passando pela conjuração Baiana e por Canudos, mas todos foram fortemente reprimidos. Além da repressão ocorrida e existente ainda hoje, há outro fator agravante, a alienação, que possibilita a manutenção do status-quo. Esta minoria dominante lança conjuntos de idéias nos Aparelhos Ideológicos de Estado, segundo o conceito de Althusser, que escamoteiam a realidade e impedem que a grande massa tome consciência dos fatos, de suas verdadeiras razões e de suas implicações, e, com isto, que realizem mudanças afetivas. Vimos que antes havia o discurso da catequese, hoje há o de que nosso país é o oitavo no PIB, que estamos eliminando o analfabetismo, de que só não enriquece quem é preguiçoso e não trabalha. Estes são discursos ideológicos que escondem a verdadeira face da história de que há os que dominam e agem de acordo com as descrições de Maquiavel e há os dominados. Há os países do primeiro mundo e há as colônias. Esta questão, da divisão de rendas e conhecimento é estrutural e aniversariante ? fará 500 anos no ano 2000. 
          Assim, podemos depreender que se por um lado há a evolução e revolução tecnológica, discussões sobre assédio sexual, propagandas para o uso de cinto-de-segurança e rede de esgoto encanada, há também escravos assalariados, uma pequena corte dominadora, favelas, países imperadores e colônias subdesenvolvidas com seus índios a serem “catequisados”. Muitas mudanças e poucas mudanças afetivas.  


Nome:   ALEXANDRE ALOISIO MALDANER 
Cidade: CHAPECÓ-SC 
Candidato ao curso (1ª opção) de: ENGENHARIA DE COMPUTAÇÃO
 
O Brasil se construiu com base numa história de distorções. A sociedade contemporânea é o resultado de um longo processo de erros, mentiras e grandes problemas não resolvidos . A moldura da história brasileira é marcada pelas injustiças e desigualdades que assolam este país. 
          O festival de enganações começa com o descobrimento e segue firme ao longo dos séculos. Descoberto pelos portugueses, o Brasil se inseriu nos quadros do Antigo Sistema Colonial, satisfazendo aos interesses externos. Na época de colônia começaram as grandes desigualdades sociais, “marca registrada” da nação. A opressão social, com o único interesse de preservar a hegemonia de uma pequena elite, é o berço das terríveis injustiças que caracterizam a sociedade. Explorado pela metrópole, o Brasil tomava o rumo da inevitável dependência econômica. O papel dos colonizadores foi colocar o país no caminho do subdesenvolvimento. 
          Vários são os exemplos de falseamento ideológico no Brasil colônia perpetuados pela história. O descobrimento em si contém uma farsa: jamais foi casual, como a história quis fazer acreditar. Daí em diante vieram outras mentiras, referentes a diversos aspectos: os contatos com os indígenas, a escravidão e o tráfico negreiro, os interesses dos colonizadores, a missão da igreja de trazer o cristianismo para os “povos pagãos” daqui. Há até a falsa idéia de que, fosse o Brasil colonizado por outra metrópole — Inglaterra ou Holanda —, não seria economicamente atrasado. Ora, os interesses seriam os mesmos, e a preocupação com a população pobre e oprimida seria igualmente nula. 
          Veio a “independência” e cresceram os espaços para o agravamento da situação. Que independência era aquela em que se preservavam todos os interesses externos em detrimento da real emancipação político- econômica? Manutenção da escravidão, crescimento constante das desigualdades, descaso das autoridades. Tanto na Monarquia como na República os problemas endêmicos do país permaneceram: concentração de terras e de renda, inexistência de oportunidades para a maioria, pobreza, fome, analfabetismo, desemprego. E as distorções estão sempre presentes, de acordo com os interesses dos grupos dominantes, tentando mostrar que o país vai bem. Foi assim na época da ascensão do café, na Era Vargas, no golpe militar com o “milagre econômico” e, atualmente, no Plano Real. 
          Efetivamente, houve fases de relativa prosperidade, com melhorias em alguns aspectos. Mas em nenhum momento houve ruptura com os laços históricos de subordinação externa; nunca foram tomadas medidas para cortar pela raiz os problemas do “Zé Povão”. 
          Diante de um quadro histórico tão assustador, as perspectivas de futuro e a situação presente podem parecer extremamente perversas. Afinal, são enormes os problemas da gente brasileira e não são nada animadoras as relações do Brasil com os países desenvolvidos: endividamento crescente, insegurança dos investidores, déficit comercial. Os erros históricos são fatores determinantes no Brasil de hoje. 
          Há, contudo, um elemento fundamental nesse povo sofrido, nesse país de contrastes. É um elemento que mantém o país na expectativa de um futuro melhor, indispensável para tornar o Brasil grande, como são grandes suas riquezas, seu território e sua gente. Esse elemento é a esperança. Aliada à força de vontade para mudar, para fazer o país crescer, para trabalhar, a esperança pode conduzir o Brasil a uma nova história, livre das amarras impostas pelos séculos de dificuldades. 


Nome:   ANA CAROLINA FREIRE COSTA 
Cidade: CAMPINAS-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: MEDICINA 
 
Um Brasil em formação 
          Quando se fala em um país, é um processo natural a formação de uma idéia estereotipada na mente de qualquer pessoa. Esta associação tende a uma generalização demasiada e raras vezes condizentes com a realidade. A Holanda tem moinhos e liberdade às drogas em Amsterdam. Já a Inglaterra conta com a respeitável Rainha Elizabeth II e também com os Hooligans que aterrorizaram Paris. De forma análoga, o Brasil está associado a mulatas, futebol, natureza exuberante, além de adjetivos recorrentes como “paraíso fiscal” e país pacífico com democracia racial. Mas generalizações, não raro, tendem ao erro. 
          A criação de mitos sempre acompanhou nossa história. O primeiro foi Cabral e sua chegada acidental à costa brasileira. 
Pesquisas vieram esclarecer que outro navegador chegara antes ao país, fato que desmonta a farsa do desvio na rota de Cabral às Índias. Não obstante, tal desvio sempre fora duvidoso, tendo base nas mudanças no Tratado de Tordesilhas à época da expansão ultramarina. 
          Outro mito que nos pertence é o do “país sem racismo”. Nada tão longe da realidade. A disparidade salarial entre negros e brancos é ultrajante. Além disso, os índios, primeiros habitantes dessa terra, hoje, lutam por reservas na floresta Amazônica e enfrentam dificuldades. Algumas tribos permanecem desconhecidas aos brancos, escondidas no interior da selva, e, desta forma asseguram sua sobrevivência. Esse conjunto de dados reais apontam para um Brasil com vários povos ainda não integrados, fugindo à ideal miscigenação que, além de racial, deveria ser cultural. Falta-nos o respeito mútuo. 
          Muito se fala em país pacífico. Não será preciso mencionar a guerra civil que os brasileiros vivem nas ruas diariamente, fugindo de assaltantes, desconfiando da polícia. Todavia, mesmo no plano internacional, não merecemos tal caracterização. O Brasil massacrou o Paraguai na pouco comentada Guerra do Paraguai. Se não carregamos a fama de assassinos como os nazistas alemães, devemos agradecer à inexistência de um Spielberg “made in Paraguai”. 
          Há que se citar nossa persistente posição de colônia. Nossa independência foi política, mas nunca financeira. Portugal utilizou nosso pau-brasil para pagar dívidas com a Inglaterra, e, há alguns meses, vendemos nossas estatais visando o pagamento de dívida externa. Por independência econômica, sofremos o imperialismo americano e somos pressionados a aceitar o ALCA. 
          Entretanto, nosso mito mais desonroso está na política. Há no país políticos presenteados com total impunidade para seus atos, que não se esforçam para construir um país melhor. Nossas leis são obsoletas e permitem uma série de ilegalidades pela falta de rigor. A falta de fiscalização nos confere o título de paraíso fiscal, e essa visão é veiculada pelo globo. 
          Mas não podemos deixar de fazer ressalvas. A maioria dos brasileiros quer ajudar a transformar nosso país. Em meio a tantos mitos e verdades perde-se a noção do caminho a seguir. Enquanto dizem que nosso nacionalismo só vem à tona no Carnaval e na Copa do Mundo de Futebol, organizamos campanhas contra a fome e violência. Temos protestos, manifestações, lutamos por um novo país. A falha integração de nossos povos vem dando lugar à unidade em esperanças por mudanças. 
          Em 500 anos de Brasil, ou muito mais quando consideramos o período somente de índios, a realidade do Brasil é extremamente complexa. E é exatamente essa complexidade que garante sermos únicos. Um país com calor humano,  gente alegre e sofrida, honesta e desonesta. Somos um país em formação. 
 


Nome:   ANA CAROLINA SANTOS DE SOUZA 
Cidade: SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: ENGENHARIA CIVIL 
 
 Brasil, ainda colônia? 
          Embora existam controvérsias a respeito da verdadeira data do descobrimento do Brasil, o país prepara-se para comemorar os seus quinhentos anos e nesse instante abre-se espaço para uma reflexão sobre o que foi e o que é aquela ex-colônia portuguesa, hoje um dos países líderes da América do Sul. Será que este “país emergente” mudou tanto em relação a colônia de exploração que outrora fôra? Dívida externa, massacre de índios, má distribuição de renda, exploração econômica e política. Em certos aspectos é difícil diferenciar a colônia portuguesa do país atual, mais difícil ainda é traçar o perfil do brasileiro “atual”. 
          Outrora o pau-brasil, hoje uma infinidade de produtos. Se antes a colônia se submetia ao domínio e exploração dos portugueses, atualmente o país, apesar de contar com maior liberdade, ainda se submete ao poder das atuais potências econômicas. O pau-brasil dera lugar a madeira de lei, ao látex e outros produtos do extrativismo vegetal, mas além destes vê-se “fugir” do país enormes quantidades de minérios e produtos agrícolas, elementos relativamente baratos cuja exportação não rende ao país o suficiente para cobrir suas elevadas dívidas, frutos das importações de tecnologia e outros produtos bem mais raros que os exportados pelo país. A dívida externa permanece, o pau-brasil não conseguira pagá-la nos tempos de colônia e o país atual também dela não consegue se livrar. 
          Num país atolado em dívidas, o nível de vida da população é conseqüência de tal. Apesar de rico, há no Brasil um enorme contingente de pobres gerados pela má distribuição de renda. Seja na cidade ou no campo, a pobreza aumenta, os contrastes sociais são marcantes. O caos começa no campo onde grandes propriedades concentram-se nas mãos de poucos e a maioria tem que dividir o pouco que resta. Nessa luta nem as terras indígenas são respeitadas, o “homem branco” rouba a terra, destrói a cultura, extermina os índios. Nesse contexto, mais uma vez nos deparamos frente a dificuldade em diferenciar a colônia do Brasil independente de hoje. 
          As cidades refletem as crises no campo, as máquinas roubam empregos de muitos camponeses, já não bastassem os donos das máquinas roubarem suas terras também. Com isso aumenta o êxodo rural, as cidades tornam-se “aglomerados humanos” que nem sempre têm condições de abrigar tanta gente. A pobreza se instala, acentuam-se as diferenças centro-periferia. 
          Nota-se portanto, que apesar do Brasil ter mudado tanto nestes seus quase quinhentos anos de descobrimento, muito daquela colônia portuguesa ainda apresenta, seja na mentalidade do povo sempre submisso seja na própria submissão do país. No campo ou na cidade as condições de vida continuam ruins, o povo ainda sofre. A economia agrário-exportadora, o domínio das elites, enfim, elementos do Brasil colônia insistem em perseguir o líder do Mercosul. Resta o povo exercer na pátria sua cidadania, pois esta é sem dúvida sua maior conquista e talvez o único caminho para uma mudança que realmente diferencie a colônia de Cabral do Brasil de hoje, para assim poder-se definir a cara de um verdadeiro povo brasileiro, a cara do próprio Brasil. 



Nome:   CAROLINA CODA MACHADO 
Cidade: SÃO CARLOS-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: ARQUITETURA E URBANISMO 
 
          Realmente, é de se estranhar que a rota das caravelas comandadas por Cabral tenha desviado tanto e, sorte, acabaram se deparando com terras nunca antes conhecidas por homens europeus. Surgem aí teorias, explicações, hipóteses, histórias que dão novas versões ao descobrimento das terras futuramente formadoras de um país chamado Brasil. Deixando tal dilema a parte, podemos perceber questões bem mais importantes a serem discutidas sobre esse país. E nada melhor do que a proximidade da data, mesmo que simbólica, de comemoração de 500 anos de descobrimento do Brasil. 
          Voltemos, então, ao passado. Passado que leva ao presente; passado cujo estudo revela episódios que terão por conseqüência a realidade que vivemos hoje. 
 Antes da chegada dos portugueses, milhões de índios ocupavam o território brasileiro. Atualmente, existem apenas alguns milhares. Foram dizimados por doenças trazidas pelos brancos, escravizados, catequizados, chacinados. Perderam suas terras, sua liberdade, sua religião, sua cultura, sua identidade como povo. Encontram-se, nos dias atuais, limitados às reservas indígenas, entrando muitas vezes em conflito com garimpeiros e fazendeiros. Observa-se a primeira injustiça social no Brasil: o homem branco, julgando-se mais desenvolvido, superior, tira do índio todo e qualquer direito. Quando entra para a história, o Brasil perde simultaneamente a história do povo indígena. 
          Podemos pensar no que aconteceria se não fôssemos colonizados pelos portugueses, mas sim por outro país europeu. Certamente estaríamos na mesma situação de subdesenvolvimento, miséria, precariedade, injustiças sociais. O motivo disso é o contexto histórico da descoberta do Brasil. O mundo era mercantilista e procurava novos mercados para vender suas manufaturas e para adquirir matéria-prima. Qualquer fosse nosso colonizador, transformaría-nos em uma colônia de exploração, e, da mesma forma que fizeram os portugueses, extrairia toda riqueza que pudessem. A diferença é que perderíamos os legados culturais portugueses, como a língua. Talvez fossemos hoje mais loiros. Calabar não foi traidor. Nem herói. Foi apenas um ingênuo ao acreditar que os holandeses seriam melhores que os portugueses para o Brasil. 
          Como ocorrem com as pessoas, os problemas do Brasil surgem desde sua infância, aumentam na adolescência e florescem quando adultas. A economia brasileira sempre voltou-se para a exportação, com seu ciclos econômicos pouco duráveis e importadores de crises. Passamos pelo ciclo da cana, ouro, borracha, café... Sempre houve uma oligarquia latifundiária, que concentrava poderes e riquezas. Nunca existiu preocupação com educação para a população, desenvolvimento de tecnologias e condições de vida. 
          Mesmo com quinhentos anos passados, percebe-se a mesma situação: a terra ainda concentrava-se nas mãos de poucos, assim como o poder e o dinheiro. Ainda somos um povo colonizado – hoje mais discretamente, debaixo do pano, pela cultura e economia americana – e servimos aos interesses de grupos exteriores. Não existe indústria brasileira, pois não há tecnologia brasileira, isso graças a falta de ensino. Da mesma forma como ocorria há muitos anos, quando a chega a crise, cortam-se os recursos da saúde e educação. Os privilégios são mantidos sempre à elite. 
          Apesar de tudo, o país cresceu. Criamos uma identidade própria. Não somos mais índios, portugueses, africanos... Formamos uma nação, fruto da mistura de culturas. Surgiram movimentos culturais inéditos. De um setor da economia, tornamo-nos uma economia; digam o que quiserem, mas isso não há como negar. Criamos obras literárias, músicas, estilos arquitetônicos... Somos um povo. Somos definitivamente, o povo brasileiro. 
          Os 500 anos de Brasil revelam uma nação sempre explorada, por ser rica, mas que, entre seus contrastes, vê o nascimento de um povo, igualmente explorado, por ser rico. Querem, é claro, apagar nosso passado, através do qual percebemos os erros e tentamos evitar que ocorram novamente. Querem, é claro, acabar com a identidade que temos como povo, para assim manter o caminho que lhes é proveitoso. O que espera-se é que baste 500 anos para acordar, de uma vez, esse gigante adormecido que é o Brasil. 



Nome:   CAROLINA FIORI 
Cidade: VALINHOS-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: MEDICINA 
 
Comemorar quinhentos anos... Por quê? 
          Proximidade do ano dois mil, o Brasil abre as portas para o terceiro milênio e, simultaneamente, o País comemora quinhentos anos de existência. Anos que não são orgulho para nenhum dos brasileiros. Afinal, os tempos mudaram, os anos se passaram e, na essência, o Brasil continua a ser o mesmo paraíso de falcatruas, misérias e devastação social. Conta a história, de maneira eufemística, que os portugueses que aqui aportaram por engano, crendo que aqui fosse as tão cobiçadas Índias. Erro de marujo? Claro que não... A História moderna rompe com uma visão infantilizada e puxa o manto róseo que escondia por debaixo a História do nosso Brasil, explorado e relegado a fornecedor de produtos a baixos custos. 
          Desde a chegada dos portugueses ao Brasil, a exploração de produtos tropicais fez-se uma constante. Primeiramente, o pau-brasil e, posteriormente o ouro e metais preciosos de Minas Gerais, as drogas do sertão, a borracha da Amazônia, etc. Sob o regime de Pacto Colonial, o lucro ia direto para os cofres portugueses. Depois vieram as monoculturas de açúcar em Pernambuco e algodão, no Maranhão. Todo o lucro então, era enviado à Europa. Invasões holandesas, francesas e, o lucro tinha como destino a Europa. Ao Brasil, portanto, restava apenas a condição de subjugado e grande importador de gêneros de primeira necessidade. 
          O que se sabe, no entanto, é que nem só de interesses mercantis vive a História. Juntamente com os portugueses, veio a idéia de catequização dos nativos brasileiros e a tentativa de enobrecer de fé a meia-alma que os portugueses julgavam que os índios possuíam. O resultado foi o extermínio de milhares de indígenas, destruição quase que total de uma cultura e a benção da Igreja por ter aberto as portas do Senhor para meia dúzia de tribos. A implantação da monocultura trouxe os negros da África para trabalharem em regime escravocrata. Esses, segundo a fé lusitana, nem alma possuíam. Depois vieram os imigrantes europeus (italianos, alemães, franceses, etc.) e asiáticos (japoneses, chineses, coreanos) engrossar o caldeirão étnico, que hoje representa toda a população brasileira. 
          Em mil oitocentos e oito, com a vinda da corte portuguesa ao Brasil e a assinatura dos tratados de Abertura dos Portos, o Brasil ensaia os primeiros passos para a independência política. Porém, a independência econômica não se estabelece. O Brasil, então, passou a conceder benefícios à Inglaterra e outras “nações amigas”. Esse panorama perdurou até o advento da monocultura cafeeira – finalmente, o café para ser o primeiro produto verdadeiramente brasileiro. Ao Brasil cabia a produção, o comércio e o lucro; embora a necessidade de ajuda externa não fosse descartada. Tudo corria dentro dos conformes até a queda da bolsa de Nova Iorque, em vinte e nove. O episódio serviu para o Brasil assistir a amarga verdade estampada na cara de país exportador de sobremesa, dependente e atrasado economicamente. Entra Vargas, sai Vargas, JK, governos militares – o Brasil cresce absurdamente ao olhos do povo e, junto com o desenvolvimento tardio e desgovernado, a dívida externa brasileira faz-se o maior bicho-papão da História. 
          Inflação nas alturas, desigualdades herdadas desde o Período Colonial, governos ditatoriais, fraudulentos, corruptos ou incompetentes. A crise social parece inevitável e, com ela cresce o número de miseráveis, desempregados, ignorantes; a violência e a marginalização nas grandes cidades; o abismo entre ricos e pobres; contrabando, bandidagem, crimes e comércio ilegal de armas e drogas. A indústria no Brasil não é verdadeiramente brasileira, depende-se de capitais externos, importa-se de tudo, desde palitos de dentes até máquinas da mais alta tecnologia. A justiça é lenta e, muitas vezes, não surte efeitos desejados. Mergulha-se cada vez mais no poço que parece não ter fundo – o poço das desigualdades, do terceiro-mundismo, condição de país exportador de matérias-primas, de país dependente e fragilizado. 
          Dentro desse contexto, o Brasil entra para o terceiro milênio e apaga quinhentas velinhas sem ganhar presente! A independência econômica está longe de se tornar realidade. O que resta é comemorar com pizza e carnaval? O mais adequado e convincente é deixar a festa para depois e trilhar o caminho do desenvolvimento próprio. Educar e politizar a população brasileira, fazer reforma agrária, combater as violências urbana e rural, investir em programas assintenciais, combater o racismo, tratar a Saúde, cuidar da Justiça; enfim, reformar toda a estrutura social, econômica e política brasileira. Talvez, transformar o Brasil em um país mais igualitário e economicamente independente, requeira outros quinhentos anos de história, mas estes quinhentos anos podem ser muito bem comemorados se nós, brasileiros, começarmos a trabalhar desde já. 
 



Nome:   GUILHERME CARDINALI BARREIRO  
Cidade:CAMPINAS-SP
Candidato ao curso (1ª opção) de: MEDICINA 
 
      O Brasil, desde o seu surgimento para o mundo, carrega grande parcela da conotação inicial a que foi submetido: uma colônia de exploração. É verdade que já não somos mais colônia, sempre acabam por absorve-lo.
     Conhece-se, atualmente, que não foi Cabral o grande agente que desmascarou essa terra nua, mas Duarte Pacheco Pereira. É interessante notar que, além das alterações necessárias aos livros de história, essa disparidade não proporciona alterações significativas quanto a história do Brasil na prática. Ambas expedições possuíam finalidades claramente pré-estabelecidas pela coroa lusa: ocupar a região de modo a garantir possíveis riquezas. Daí advém todo o processo de exploração persistente sobre o território brasileiro. Com Pacheco Pereira, ou Cabral, ou quem quer que fosse mandado por Portugal, abriram-se os caminhos para desbravar as terras brasileiras, que, de início, ofereceram nada mais que o pau-brasil. A este, seguiram a cana- de-açucar, o ouro, o café e tantos outros.
      As alternâncias de produção pelas quais a metrópole submetia o Brasil caracterizam a busca incessante daquela pelas riquezas americanas. Em meio a essa exploração voraz, emergiu o povo brasileiro, um fruto do sistema imposto pelos portugueses. O enclausuramento sufocante desta origem influenciou nas características e caminho que o povo novo viria a seguir. Como éramos um povo dominado e controlado, refletiu-se na sua evolução particular a disparidade de renda, os abusos por parte dos detentores do poder político e econômico e a submissão total dos desprivilegiados. Assim, por mais que o escritor Affonso Celso tentasse, no início do século, se ufanar (?) do país, a verdade parecia preferir as palavras de seu contemporâneo Sílvio Romero, que nos caracterizou como um "povo flagelado por todas as extorsões".
      É notório também o fato de o Estado brasileiro sempre ter representado a elite brasileira, como fora evidenciado pelo próprio Sílvio Romero há mais de um século. Essa representatividade da elite determinou a expansão das injustiças sociais, no decorrer das décadas, uma vez que segregou política e economicamente duas classes: os poderosos e a massa. A primeira, tendo controle sobre a maquina governamental, obviamente ditou os destinos da nação em favor de seus interesses particulares. Já a Segunda, ficou à mercê das oscilações daquelas, esperando sempre os prejuízos inerentes a uma administração tendenciosa, e quanto muito, recebendo benefícios legislativos igualmente tendenciosos, que camuflavam a verdadeira exploração a que essa classe estava submetida.
      Atualmente, a situação brasileira espelha todo o processo de evolução deste povo. A política neoliberalizante do presidente FHC não passa, grosseiramente, do atendimento às vontades da elite nacional aliada aos interesses estrangeiros ?  como sempre fora no Brasil. Quanto às massa populacionais restou-lhes o desemprego e a queda na qualidade conseqüências que também remetem ao passado histórico do país.
      Fica claro, portanto, que, após 500 anos, o Brasil apresenta graves defeitos, apesar de ter conseguido a 62ª colocação na ultima classificação do IDH. Ainda é importante ressaltar que essa melhor colocação deve-se ao fato do país ter elevado o seu PIB per capita, que esconde um dos mais graves problemas brasileiros: a disparidade de renda e as injustiças sociais provenientes dela. Percebe-se que a análise feita por Carvalho Filho, na FSP de 3 de outubro, dizendo que o país crescera é uma análise superficial da realidade nacional; teoricamente, após 500 anos, somos um país coerente, mas, na prática, observa-se o oposto.



Nome:   JOSÉ FLÁVIO GOMES MARIN 
Cidade: MARÍLIA-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: MEDICINA 
 
É hora de acordar! 
 
          Apesar da euforia e do certo ufanismo de alguns, o 500? aniversário do descobrimento do Brasil não é digno de festividades ou celebrações rodeadas de espetáculos. Esta data, em vez de alvo de comemorações deve ser vista como uma oportunidade para analisarmos a história de um país que desde a sua gênese foi comandado pelos interesses do capitalismo internacional, mesmo tendo com isto, a sua população vitimada por gritantes injustiças e exclusões sociais, políticas e culturais. 
          Das capitanias hereditárias aos grandes monopólios transnacionais, passando pelos latifúndios cafeicultores, a essência das estruturas sócio-econômicas da nação não se alterou, pois a riqueza nacional é explorada por uma oligarquia praticamente hereditária, a qual exaure os recursos do país para enviá-los ao exterior, mantendo o Brasil na órbita do sistema capitalista. Atrelada a esta dominação econômica vem a submissão cultural, valoriza-se o que vem de outros países, independente do significado e/ou utilidade, apenas porque confere status aos seus possuidores. 
          Outro tópico que deve ser discutido e reformulado, é a nossa história, principalmente o modo com que esta foi contada nestes 500 anos. Desde a carta do descobrimento, feita por Caminha, a realidade é fantasiada, para não dizer mascarada, na tentativa de transformar fatos históricos em feitos heróicos e espetaculares, incluindo aí guerras, descobrimentos ou atitudes dos governantes. É sabido que a maioria das “revoluções” retratadas nos livros da história brasileira nada mais são do que meros acordos entre as elites para manterem seus poderes. Como exemplo basta citar a independência, que de forma pacífica, celebrou uma acomodação das estruturas de dominação ao contexto mundial que vigorara, o liberalismo. Em suma, mudam-se as aparências, mas a essência do país continua a mesma. 
          Embora submetida a tantas provações, a população brasileira inegavelmente, conseguiu constituir uma identidade, pois trata-se de um povo pacífico, receptivo e muito batalhador. Esta identidade, no entanto, é freqüentemente abalada pelos estereótipos que se criaram a respeito do brasileiro, estereótipos os quais recaem, não raro, no já falado binômio samba e futebol. 
          Somente com a construção de um sentimento de valorização ao país, de um questionamento a respeito de sua situação atual, é que o Brasil, a partir dos erros que o marcaram até o presente momento, poderá aprender, auxiliado por uma história clara e concisa, a se portar como uma verdadeira nação, na qual predominem a justiça e a plena democracia, deixando de ser assim o gigante eternamente adormecido pela opressão, exclusão e injustiça. 



Nome:   LUCIANA ARAÚJO DA SILVA 
Cidade: CAMPINAS-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: ARTES CÊNICAS 
 
          Em abril de 2000 o Brasil comemora 500 anos de seu descobrimento – segundo data aceita oficialmente. Sem perder tempo a mídia começa a bombardear-nos com os preparativos para a festa, e com dois anos de antecedência a TV já mostra um relógio que nos avisa a cada dia quantos dias faltam para o grande bacanal. É outra oportunidade, além da copa do mundo, para que cada cidadão vista uma camisa verde-amarela sem medo de parecer cafona, empunhe a bandeira e ensaie cantar o Hino Nacional – como será mesmo que se começa aquela 2ª parte? 
          Na verdade, a data deveria, no mínimo, servir para que questões sérias e profundas fossem levantadas a fim de se fazer um balanço histórico dos cinco séculos do país. Será que os saldos seriam tão otimistas, ou inspirariam luto? 
          A farsa que se representa com uma comemoração ufanista não deixa ver quem é o Brasil, ou quem somos nós hoje. E quem somos, mesmo? Um povo que carrega os grilhões da escravidão – a maior vergonha da nossa história. Negros e índios, escravos de senhores brancos, portugueses, estes aliados da Coroa que por sua vez era submissa a um senhor maior, a Inglaterra. Mas a nossa escravidão não teve fim com a assinatura de um documento pelas mãos de uma princesa benevolente, em 1888. Ela perdura até nossos dias. Só temos mudado de dono, de senhorio. Agora, após termos assimilado a subserviência ideológica aos EUA, passamos a servir as grandes instituições financeiras do mundo globalizado. Aliás, o país já sentiu o gostinho das conseqüências dessa opção com o efeito dominó da crise nos países asiáticos. 
          Há aqueles otimistas, que vêem os progressos miraculosos da nação. Temos uma Constituição exemplar, que pune crimes como o racismo, protege o consumidor, trata de questões como a posse da terra, a educação, os direitos da mulher, da criança. Coisa de país desenvolvido! Outro aspecto que não pode ser esquecido ao comemorarmos os 500 anos é a autenticidade do povo brasileiro. A nossa famosa alegria (temos o carnaval), a solicitude do povo, a “malemolência” dos trópicos – nossas características reconhecidas internacionalmente. 
          Entretanto, no que diz respeito as nossas “conquistas”, às leis, por exemplo, não há muito o que glorificar. Ao longo desses 500 anos a história é sempre a mesma. No nosso país há leis que “pegam” e leis que “não pegam”. A terra vem servindo a interesses de pequenos grupos desde as sesmarias até os latifúndios – não tem função social prevista na atual constituição. Quanto ao racismo, ele continua forte e vemos isso no dia a dia, em dados irreais como os do senso realizado em 96 pelo IBGE que aponta uma população constituída de 55% de brancos, 34% de mestiços e 5% de negros. 
          O Brasil hoje não é europeu, africano, asiático, indígena. Nós somos a mistura exata de tudo isso, completamente diferente das nossas origens, únicos. E apesar disso estamos indiscutivelmente atrelados aos princípios da nossa matriz. Talvez o ano 2000 possa servir para abrirmos os nossos cinco séculos coloniais, enterramos o que sobrou dele. Pegaríamos então a água salubre que – pasmem – ainda resta nessas terras de cá, e regaríamo-nas para que nela fossem cultivadas as sementes de um outro Brasil. Que não precisasse olhar prá trás e esconder o rosto de vergonha, nem olhar para a frente e ter esperança. Mas que, enfim, se olhasse no espelho e sorrisse. 



Nome:   PABLO ARANTES 
Cidade: BRASÍLIA-DF 
Candidato ao curso (1ª opção) de: CIÊNCIAS ECONÔMICAS 
 
          O Brasil é um país tão extraordinário que, às vésperas da comemoração dos seus 500 anos, descobre-se que a validade histórica de tal celebração é assaz duvidosa. Querelas históricas à parte, é certo que merecemos um balanço de nossa existência, tenha ela os quinhentos anos cabralinos ou não. É certo também que tal balanço deve considerar os imensos contrastes brasileiros, em ordem a decidir qual é a imagem mais pertinente desta terra; se é o éden preconizado pelo ufanista Afonso Celso ou a nova Roma – banhada em sangue negro, índio e luso – descrita por Darcy Ribeiro. 
          O sociólogo francês Roger Bastide, quando visitou o Brasil, impressionou-se com o verdadeiro caleidoscópio de realidades múltiplas e contrastes que constituía nosso país e deu àquilo que viu o apodo de “país dos contrastes”. Empiricamente, esta é uma tese de comprovação razoavelmente simples, se considerarmos que um observador ao qual se incumbisse a tarefa de promover um inquérito sobre nosso país depararia-se, ao longo de sua missão, imensas disparidades. Começando pelo domínio natural, seguiram-se diante dos olhos atônitos do pesquisador imaginário biomas tais como: o cerrado, o pantanal, a mata atlântica, a Amazônia, o pampa gaúcho e o semi-árido nordestino. De par a esta percepção, a investigação também reconheceria modos de vida e organizações sociais díspares: a riqueza industrial do Sul e o atraso secular do Nordeste. Desta feita, seria então lícito aduzir a conclusão de que coexistem no mesmo território não um, mas diversos países? 
          Alguns retorquiriam, negando veementemente essa proposição. Certos observadores postulam que há uma unidade subjacente à aparente pluralidade de cenários perceptíveis. Segundo esta linha de raciocínio, é possível localizar os liames entre o Brasil pobre e o rico na relação de dependência existente entre um e outro. Nesse pensamento, que vê o país como um sistema onde componentes separados interagem entre si, a parte rica e moderna alimenta-se do subdesenvolvimento e da miséria da parte pobre. Os modelos de desenvolvimento perpetrados ao longo de nossa história, concentraram a produção em pontas determinadas no espaço geográfico e a riqueza nas mãos da classe dominante. Esta classe dominante, por sua vez, sempre tirou proveito das discrepâncias regionais, impondo seu domínio e amealhando, através do sistema político, o poder necessário à perpetuação de seus desígnios. 
          Seja qual for a exegese para nosso país, notabilizamo-nos pela fluidez e força criativa da nossa cultura sincrética e miscigenada. Ao longo da odisséia que constituiu nosso país como nação, a esperança de que seremos capazes de superar nossas injunções e impasses tem alimentado muitos sonhos de mudança. Esta infatigável vocação para crer em um futuro melhor já é um bom começo, pois como disse o escritor Mário Lago: “No dia em que perdermos a capacidade de ter esperança, podem apagar o arco-íris”. 


Nome:   THAIS CRISTINA CHAVES 
Cidade: CAMPINAS-SP 
Candidato ao curso (1ª opção) de: MEDICINA 
 
A Antropofagia deturpada 
          Ao completarmos quinhentos anos de existência aos “olhos do mundo europeu”, é no mínimo incoerente deixar de cogitar até que ponto incorporamos, ao nosso “psiquismo”, essa visão européia da “terra do pau-Brasil” e o quanto nos utilizamos dela como referencial para nossa auto-identificação. 
          O próprio movimento antropofágico, criado por modernistas na década de vinte, fazia menção ao fato de que deveríamos sim “engolir”, incorporar, as idéias e tendências vindas do velho mundo. Entretanto esse ato de “canibalismo” deveria ser sempre acompanhado por uma “digestão” sistemática e seletiva, e seguida por uma excreção traumática do que fosse considerado “dejeto”, ou seja, idéias que só serviriam para manter o Brasil sob as égides ideológicas da metrópole européia. 
          Sempre praticamos este “antropofagismo deturpado”, deixamo-nos corromper pela ideologia pragmática européia e nos esquecemos de jogar os “excrementos” ao lixo. O Europeu trouxe em sua bagagem seu sistema político e econômico pronto para ser colocado em prática, o colonialismo fez uso extremado de nossas ditas “riquezas naturais” e nos deixou como legado uma “vocação eterna” para fornecer as chamadas matérias–primas, e dispostos a nos entrarmos neste conformismo de sermos um “país abençoado por Deus”. Movido pelo próprio imediatismo, herdado de nossos ancestrais portugueses, deixou-se de se utilizar dessa “riqueza natural” abundante para desenvolver uma tecnologia de ponta, capaz de nos fornecer autonomia e autogestão. 
          A elite brasileira continua com seus olhos voltados para o mar e de “costas” para o Brasil, impregnados pelo status quo de europeus em exílio na colônia e sem buscar alternativa para um enraizamento cultural, se voltam contra a realidade nacional. Esquecem-se do fato de que não apenas uma “filial portuguesa” na América, mas uma nova raça, que precisa de políticas de inserção específicas e que se baseiam em dados da nossa própria realidade, afinal de contas somos o “melting-pot”. 
          Até os dias atuais nossa elite sustenta-se e sustenta o Brasil à custa de investimentos estrangeiros. Esquece-se de consolidar aqui uma indústria forte e voltada para pesquisa de campo nacional. Resolveu simplesmente abrir as portas, e todo o resto para o capital estrangeiro. O mundo mudou. O Brasil não. Precisamos acompanhar esses novos contornos econômicos da era globalizada. Não deixaremos nunca de pagar juros de dívidas se continuarmos a deixar de investir em nossa própria gente, pois falar em riquezas  naturais como o grande patrimônio do Brasil, é no mínimo um grande sofisma , se considerarmos que, na atualidade riqueza não é sinônimo de conhecimento, ou “royalties”, de patentes. 
          Hoje somos parte do grupo dos chamados “emergentes”, continuamos a ser vistos e a nos olharmos com os olhos segregacionistas do mundo europeu e do desenvolvido. Modernizamos sim em vários aspectos nossas instituições, mas em grande parte estas refletem a falta de políticas nacionais estruturais atuantes, no que se diz respeito ao cidadão, marcados pela corrupção e pelo descaso por nossas próprias questões. No Brasil de hoje continuamos a nos “embebedar” pelo culto ao estrangeiro, elegendo até mesmo um presidente que reflete a própria visão do europeu do que seria um perfeito Estadista. Mas um perfeito governante no Brasil, não condiz com o modelo um  perfeito Estadista europeu. Mario de Andrade talvez hoje nos aconselharia: “façamos a antropofagia, mas que ela seja a antropofagia do Brasil, pelo próprio Brasil”. Esse imenso estrangeiro nacional a ser descoberto. 


Vejam outras redações no link abaixo:
http://www.convest.unicamp.br/vest99/redacao/item5.html

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