terça-feira, 17 de maio de 2011

CANTIGAS TROVADORESCAS



O Trovadismo surgiu entre os séculos XII e XV, período da Idade Média e também do feudalismo. Teve origem no sul da França e foi o primeiro movimento do mundo ocidental.
Expandiu-se em virtude dos jograis provençais; o jogral era um artista do entretenimento, que divertia a nobreza e a expressão "Trovadismo", vem de "trovador", nome dado ao poeta da época.

O galego-português (também chamado de galaico-português, proto-galego-português, português antigo, português arcaico, galego antigo, galego arcaico) foi a língua falada durante a Idade Média nas regiões de Portugal e da Galiza (Espanha); dela descendem as atuais línguas portuguesa e galega. Assim, o galego-português é o idioma ancestral comum às línguas galaico-portuguesas.

A língua considera-se formada no século VIII, principalmente como desenvolvimento do latim vulgar falado pelos conquistadores romanos a partir do século II d.C. No seu momento, foi língua culta fora dos reinos da Galiza e de Portugal, nos reinos vizinhos de Leão e Castela. Assim, o rei castelhano Afonso X o Sábio escreveu as suas Cantigas de Santa Maria em galego-português. A sua importância foi tal que é considerada a segunda literatura mais importante durante a Idade Média europeia, só perdendo para o occitano.

O documento da lírica galego-portuguesa mais antigo parece ser a cantiga satírica "Ora faz ost'o senhor de Navarra" de João Soares de Paiva, datado de 1196 por alguns. As recompilações líricas medievais galego-portuguesas mais importantes são:
O jogral era de nível social inferior ao trovador, que era o autor das cantigas, que as executava mediante ao recebimento do soldo.

As manifestações eram realizadas em cantigas, poemas cantados pelos trovadores acompanhados de instrumentos musicais como a cítara, a lira, a harpa, a viola e o alaúde, entre outros, mas também era por meio de versos em prosa que contavam novelas de cavalaria, como por exemplo a obra "A demanda do Santo Graal".

Essa novela conta a história de aventuras de cavaleiros medievais escolhidos pelo Rei Artur, que procuram o Santo Graal – o cálice sagrado com que José de Arimatéia teria recolhido o sangue de Jesus Cristo.

As cantigas eram divididas em dois grupos: lírico-amorosa e satírica. O primeiro em formas de cantiga de amor e de e amigo; o segundo em cantigas de escárnio e de maldizer.
São algumas características das cantigas de amor: o eu-lírico é sempre masculino, retrata um amor impossível com uma mulher que é casada e pertence a uma classe superior à do trovador, segue uma forma de amor cortês.

Nas cantigas de amigo nota-se: o eu-lírico é feminino, apesar de escritas por homens; ao contrário da cantiga de amor, onde o sentimento não se realiza fisicamente, na cantiga de amigo (entende-se por amigo, o amado) há nítidas referências à saudade física do amigo ausente.

Os trovadores não só se dedicavam ao lirismo do amor, mas também gostavam da sátira, onde procuravam ridicularizar os hábitos e costumes da época, outros trovadores e as mulheres. As cantigas de escárnio eram críticas indiretas e irônicas. Já as de maldizer caracterizavam-se pelas críticas diretas e mais grosseiras que as de escárnio.
Vamos conhecer alguns exemplos das cantigas, em linguagem atual:


Cantigas de Amor

"A dona que eu sirvo e que muito adoro mostrai-ma, ai Deus!
pois que vos imploro, senão, dai-me a morte!
 A que me fizestes mais que tudo amar,
mostrai-ma onde possa com ela falar, senão, dai-me a morte".

Quer'eu em maneira de proençal
fazer agora un cantar d'amor,
e querrei muit'i loar mia senhor
a que prez nen fremusura non fal,
nen bondade; e mais vos direi en:
tanto a fez Deus comprida de ben
que mais que todas las do mundo val.
Ca mia senhor quiso Deus fazer tal,
quando a faz, que a fez sabedor
de todo ben e de mui gran valor,
e con todo est'é mui comunal
ali u deve; er deu-lhi bon sen,
e des i non lhi fez pouco de ben,
quando non quis que lh'outra foss'igual.
Ca en mia senhor nunca Deus pôs mal,
mais pôs i prez e beldad'e loor
e falar mui ben, e riir melhor
que outra molher; des i é leal
muit', e por esto non sei oj'eu quen
possa compridamente no seu ben
falar, ca non á, tra-lo seu ben, al.

El-Rei D. Dinis, CV 123, CBN 485

Proençaes soen mui ben trobar
e dizen eles que é con amor;
mais os que troban no tempo da frol
e non en outro, sei eu ben que non
an tan gran coita no seu coraçon
qual m'eu por mha senhor vejo levar.
Pero que troban e saben loar
sas senhores o mais e o melhor
que eles poden, soõ sabedor
que os que troban quand'a frol sazon
á, e non ante, se Deus mi perdon,
non an tal coita qual eu ei sen par.
Ca os que troban e que s'alegrar
van eno tempo que ten a color
a frol consigu', e, tanto que se for
aquel tempo, logu'en trobar razon
non an, non viven [en] qual perdiçon
oj'eu vivo, que pois m'á-de matar.

El-Rei D. Dinis, CV 127, CBN 489

Cantiga de Amigo

 "Sem meu amigo sinto-me sozinha e
não adormecem estes olhos meus.
Tanto quanto posso peço a luz a Deus e
 Deus não permite que a luz seja minha."


"Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo! "

Martin Codax, CV 884, CBN 1227

Pois nossas madres van a San Simon
de Val de Prados candeas queimar,
nós, as meninhas, punhemos de andar
con nossas madres, e elas enton
queimen candeas por nós e por si
e nós, meninhas, bailaremos i.
Nossos amigos todos  lá irán
por nos veer, e andaremos nós
bailando ante eles, fremosas en cós,
e nossas madres, pois que alá van,
queimen candeas por nós e por si
e nós, meninhas, bailaremos i.
Nossos amigos irán por cousir
como bailamos, e podem veer
bailar moças de bon parecer,
e nossas madres pois lá  queren ir,
queimen candeas por nós e por si
e nós, meninhas, bailaremos i.

Pero de Viviãez, CV 336, CBN 698


Cantigas de Escárnio

 "Conheceis uma donzela
por quem trovei e a que um dia
 chamei Dona Beringela?
 Nunca tamanha porfia vi nem mais disparatada.
Agora que está casada
chamam-lhe Dona Maria."

Foi um dia Lopo jograr
a casa duü infançon cantar,
e mandou-lhe ele por don dar
três couces na garganta,
e foi-lhe escasso, a meu cuidar,
segundo como el canta
Escasso foi o infançon
en seus couces partir' enton,
ca non deu a Lopo enton
mais de três na garganta,
e mais merece o jograron,
segundo como el canta.

Martin Soarez, CV 974



Cantigas de Maldizer

"Ai, dona feia, foste-vos queixar de que vos nunca louvo em meu trovar;
e umas trovas vos quero dedicar em que louvada de toda a maneira sereis;
tal é o meu louvar: dona feia, velha e gaiteira."

Roi Queimado morreu con amor
en seus cantares, par Sancta Maria,
por Da dona que gran ben queria:
e, por se meter por mais trobador,
porque lhe ela non quis ben fazer,
feze-s'el en seus cantares morrer,
mais resurgiu depois ao tercer dia!
Esto fez el por üa sa senhor
que quer gran ben, e mais vos en diria:
por que cuida que faz i maestria,
enos cantares que faz, á sabor
de morrer i e des i d'ar viver;
esto faz el que x'o pode fazer,
mais outr'omem per ren' nono faria.
E non á já de sa morte pavor,
senon sa morte mais la temeria,
mais sabe ben, per sa sabedoria,
que viverá, des quando morto for,
e faz-[s'] en seu cantar morte prender,
des i ar vive: vedes que poder
que lhi Deus deu, mais que non cuidaria.
E, se mi Deus a mim desse poder
qual oj'el á, pois morrer, de viver,
já mais morte nunca temeria.

Pero Garcia Burgalês, CV 988, CBN 1380


As cantigas lírico-amorosas e as satíricas foram reunidas na forma escrita em cancioneiros, dentre os quais destacam-se: Cancioneiro da Ajuda, o mais antigo, com 310 cantigas, quase todas de amor; Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa, também conhecido como "Collocci-Brancutti", com 1.647 cantigas e Cancioneiro da Vaticana, com 1.205 cantigas, ambos com os quatros tipos.

O primeiro documento em língua portuguesa é provavelmente a "Cantiga da Ribeirinha", datada de 1189 ou 1198, escrita por Paio Soares de Taveirós. A interpretação oscila entre o lirismo e a sátira, mas também podendo ser uma cantiga de amor.

No mundo ninguém se assemelha a mim
enquanto a vida continuar como vai,
porque morro por vós, e ai
minha senhora branca e vermelha,
quereis que vos retrate
quando vos eu vi sem manto.
Maldito dia! Me levantei
que não vos vi feia

E, mia senhora, desde aquele dia, ai!
tudo me foi muito mal
e vós, filha de don Pai
Moniz, e bem vos parece
de ter eu por vós guarvaia
pois eu, minha senhora, como presente
Nunca de vós houve nem hei
de valor insignificante.
Obs.: a guarvaia era um manto luxuoso, provavelmente de cor vermelha, usado pela nobreza.

Nenhum comentário:

Postar um comentário