segunda-feira, 2 de maio de 2011

Hipálage

  Consiste num expediente retórico em que uma palavra ocupa o lugar de outra 


Há no título dois termos que, indubitavelmente, representam o ponto central de nossa discussão – “retórica e figuras de linguagem”. Estes, portanto, revelam-nos significativos indícios de que se trata de algo voltado para uma linguagem subjetiva, a qual se evidencia mediante recursos utilizados pelo emissor no intento de atribuir um caráter enfático à mensagem.


Constatação esta extremamente plausível, pois a hipálage, ora caracterizada como uma figura de construção ou de sintaxe, representa um estilo linguístico bastante difundido pelos representantes do Realismo e do Simbolismo. Um dos artistas que se ocupou em retratá-la em suas obras foi Eça de Queirós que, influenciado por Gustave Flaubert, deixou-nos registradas construções como:


“Fumando um pensativo cigarro” / “Uma alvura de saia moveu-se no escuro”. Ao analisarmos o discurso nelas presente, constatamos um desajuste entre termos gramaticais e semânticos, isto é, entre a função e o sentido das palavras na frase, materializado pela mudança de significado. Assim, no sentido de reforçarmos ainda mais a presente afirmativa, analisemos as palavras de Massaud Moisés, em seu Dicionário de Termos Literários, o qual define a hipálage da seguinte forma:


“Constitui um expediente retórico segundo o qual um determinante (artigo, adjetivo, complemento nominal) troca o lugar que logicamente ocuparia junto de um determinado (substantivo) para associar-se a outro” .
Tais elucidações permitem-nos inferir que no primeiro exemplo o sentido expresso pela anunciação é demarcado por uma característica atribuída ao cigarro – o de ser pensante, invés de atribuí-la ao ser humano. Dessa forma, o discurso quando reanalisado se apresentaria como “pensativo, estava fumando um cigarro”. Quanto ao segundo, temos que “alguém com uma saia branca moveu-se no escuro”. Vale lembrar que não somente na linguagem literária a hipálage se faz presente, mas também em construções típicas do nosso cotidiano, populares por sinal, uma vez manifestadas por:


“Cortei meu cabelo”, referindo-se ao sentido de ir ao cabeleireiro.

“Ela já fez várias cirurgias”, remetendo-se ao sentido de ser o cirurgião quem as fez, e não a própria pessoa.

“A bicicleta furou o pneu”, em detrimento a um objeto responsável por tal ocorrência.

“O sapato não entra nos pés”, quando na verdade são os pés que não cabem no sapato.

“O garoto quebrou o braço ao cair”, sendo que o garoto não foi o autor do fato, mas sim o receptor da ação.
E como não mencionar sua “cota de participação” até nos versos do Hino Nacional, uma vez expressa por:

“Ao som do mar e à luz do céu profundo”, quando, na prática, tal profundidade deveria se referir ao mar, e não ao céu.

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