O Barroco: século XVII
CONTEXTO HISTÓRICO
- Contrarreforma;
- Renascimento.
CARACTERÍSTICAS
- Conflito entre corpo e alma;- Passagem do tempo;
- Cultismo e conceptismo;
- Figuras de linguagem.
PRINCIPAIS AUTORES
- Bento Teixeira;- Gregório de Matos Guerra;
- Padre Antonio Vieira.
Responsável pelo desenvolvimento da prosa no período do barroco, Padre Antônio Vieira é conhecido por seus sermões polêmicos em que critica, entre outras coisas, o despotismo dos colonos portugueses, a influencia negativa que o Protestantismo exerceria na colônia, os pregadores que não cumpriam com seu ofício de catequizar e evangelizar (seus adversários católicos) e a própria Inquisição.
Além disso, defendia os índios e sua evangelização, condenando os horrores vivenciados por eles nas mãos de colonos e os cristãos-novos (judeus convertidos ao Catolicismo) que aqui se instalaram. Famoso por seus sermões, padre Antônio Vieira também se dedicou a escrever cartas e profecias.
Mito do Sebastianismo
Com o desenvolvimento do mercado marítimo, Portugal vivenciou um período de ascenção e grandeza. Porém, com o declínio do comércio no Oriente, Portugal viveu uma crise econômica e dinástica. Como consequência, o então rei de Portugal D. Sebastião resolve colocar em prática seu plano de organizar uma cruzada em Marrocos e levando à batalha de Alcacer-Quibir em 1578.
A derrota na batalha e seu dedesaparecimento (provável morte em batalha), gerou especulações acerca de seus paradeiro. A partir de então, originou-se a crença de que o rei retornaria para transformar Portugal novamente em uma grande potência econômica. Padre Antônio Vieira era um dos que acreditavam no Sebastianismo e, mais adiante, Antônio Conselheiro anunciava o retorno de D. Sebastião nos episódios da Guerra de Canudos.
Os sermões
Escreveu cerca de duzentos sermões em estilo conceptista, isto é, que privilegia a retórica e o encadeamento lógico de ideias e conceitos. Estão formalmente divididos em três partes:
Intróito ou Exórdio: a apresentação, introdução do assunto.
Desenvolvimento ou argumento: defesa de uma ideia com base na argumentação.
Peroração: parte final, conclusão.
Seus sermões mais mais famosos são:
Sermão da Sexágésima (1655):
O sermão, dividido em dez partes, é conhecido por tratar da arte de pregar. Nele, Padre Antônio Vieira condena aqueles que apenas pregam a palavra de Deus de maneira vazia. Para ele, a palavra de Deus era como uma semente, que deveria ser semeada pelo pregador. Por fim, o padre chega à conclusão de que, se a palavra de Deus não dá frutos no plano terrreno a culpa é única e exclusivamente dos pregadores que não cumprem direito a sua função. Leia um trecho do sermão:
Ecce exiit qui seminat, seminare. Diz Cristo que "saiu o pregador evangélico a semear" a palavra divina. Bem parece este texto dos livros de Deus ão só faz menção do semear, mas também faz caso do sair: Exiit, porque no dia da messe hão-nos de medir a semeadura e hão-nos de contar os passos. (...) Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem a semear, há outros que semeiam sem sair. Os que saem a semear são os que vão pregar à Índia, à China, ao Japão; os que semeiam sem sair, são os que se contentam com pregar na Pátria. Todos terão sua razão, mas tudo tem sua conta. Aos que têm a seara em casa, pagar-lhes-ão a semeadura; aos que vão buscar a seara tão longe, hão-lhes de medir a semeadura e hão-lhes de contar os passos. Ah Dia do Juízo! Ah pregadores! Os de cá, achar-vos-eis com mais paço; os de lá, com mais passos: Exiit seminare. (...) Ora, suposto que a conversão das almas por meio da pregação depende destes três concursos: de Deus, do pregador e do ouvinte, por qual deles devemos entender a falta? Por parte do ouvinte, ou por parte do pregador, ou por parte de Deus? (...)
Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda (1640):
Neste sermão, o padre incita os seguidores a reagir contra as invasões Holandesas, alegando que a presença dos protestantes na colônia resultaria em uma série de depredações à colônia. Leia um trecho do sermão:
Se acaso for assim — o que vós não permitais — e está determinado em vosso secreto juízo, que entrem os hereges na Bahia, o que só vos represento humildemente, e muito deveras, é que, antes da execução da sentença, repareis bem, Senhor, no que vos pode suceder depois, e que o consulteis com vosso coração enquanto é tempo, porque melhor será arrepender agora, que quando o mal passado não tenha remédio. Bem estais na intenção e alusão com que digo isto, e na razão, fundada em vós mesmo, que tenho para o dizer. Também antes do dilúvio estáveis vós mui colérico e irado contra os homens, e por mais que Noé orava em todos aqueles cem anos, nunca houve remédio para que se aplacasse vossa ira. Romperam-se enfim as cataratas do céu, cresceu o mar até os cumes dos montes, alagou-se o mundo todo: já estaria satisfeita vossa justiça, senão quando ao terceiro dia começaram a boiar os corpos mortos, e a surgir e aparecer em multidão infinita aquelas figuras pálidas, e então se representou sobre as ondas a mais triste e funesta tragédia que nunca viram os anjos, que homens que a vissem, não os havia.
Sermão de Santo Antônio (1654):
Também conhecido como "O Sermão dos Peixes", pois nele o padre usa a imagem dos peixes como símbolo para fazer uma crítica aos vícios dos colonos portugueses que se aproveitavam da condição dos índios para escravizá-los e sujeitá-los ao seu poder. Leia um trecho do sermão:
Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? (...) Enfim, que havemos de pregar hoje aos peixes? Nunca pior auditório. Ao menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam. Uma só cousa pudera desconsolar o Pregador, que é serem gente os peixes que se não há-de converter. Mas esta dor é tão ordinária, que já pelo costume quase se não sente (...) Suposto isto, para que procedamos com clareza, dividirei, peixes, o vosso sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas atitudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios. (...)
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Vieira visitou os salões reais. Viajou pelos locais mais afastados do Brasil. Instalou-se no Maranhão. Estendeu a missão jesuíta. Aprofundou a sua relação com os índios.
Era conhecido pelos índios como Paiaçu (grande padre).
Constituiu-se numa espécie de apóstolo da palavra. O termo apóstolus do grego significa “mensageiro”, “enviado”, “embaixador”, “ministro”, “caminhante”. Foi o próprio Cristo quem chamou os seus discípulos de apóstolos. Eles seriam os pregoeiros das boas novas.
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Vieira é o eminente “embaixador” da Palavra, que leva em seus lábios a certeza da equidade.
Para ele: Subir ao púpito e não dizer a verdade era contra o ofício.
Por isso, todas as vezes que se colocava de pé com a missão de proferir o Evangelho, era invadido pelo calor do Espírito Divino.
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Pregava com tamanha beleza, erudição; com uma inspiração tão irradiada, que os salões das igrejas ficavam pequenos para a quantidade de pessoas que iam ouvi-lo.
Esse poder de Vieira levou o poeta Fernando Pessoa a dizer que ‘se não houvesse mais ninguém para falar a língua portuguesa, mas se em compensação ficassem os sermões de Vieira, a língua lusa jamais morreria’.
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Em suma: Vieira consegue reunir em seus sermões o que de mais belo há na língua portuguesa. Ele soube utilizá-la como ninguém. Extraiu dela todo o encanto; os vernáculos harmônicos e dissonantes; a versatilidade e a flexibilidade dos termos necessários. Proferiu com tamanha graça a língua de Camões que ler os seus sermões após tanto tempo causa-nos uma impressão singular.
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Neste ano de 2008 são completados quatro séculos do seu nascimento.
Ouvi poucos falarem desse acontecimento. Até mesmo os estudantes de Letras não atentaram para o fato de que no dia 6 de fevereiro de 1608, nascia, em Lisboa, Antônio Vieira, estadista, teólogo, missionário, padre – e por que não dizer filósofo?
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A homenagem que vi aconteceu na Câmara dos Deputados da República.
Ouvi José Sarney solitariamente proferir um discurso com rasgos de uma erudição afetada, tentar lançar luzes sobre as trevas da memória opaca da nação. A pouca memória do país para com os seus ilustres personagens históricos não permitiu que rendesse a ele, Vieira, homenagens dignas, do mais alto jaez. Lamentavelmente a memória é suprimida, a História é apagada e os grandes homens de espíritos livres borrados e negligenciados.
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Viveu 91 anos (morreu no dia 18 de julho de 1697).
Muito tempo para a expectativa de vida da época. Todavia, todo este tempo foi dedicado em sua integralidade à justiça e à defesa dos direitos humanos – especialmente dos índios.
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Não poderia deixar de finalizar sem mencionar Vieira num dos sermões mais belos e altivos que já foram pregados – O Pranto e o Riso ou as Lágrimas de Heráclito defendidas em Roma pelo padre Antônio Vieira contra o Riso de Demócrito.
Este sermão foi proferido no Palácio da rainha Cristina da Suécia, no ano de 1674:
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“Quem verdadeiramente conhece o mundo, precisamente há de chorar; e quem ri, ou não chora, não o conhece”.
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É pertinente dizer que a vida de Vieira foi bela por que riso; e foi arte por que lágrimas. Ele conhecia o mundo e a alma humana como ninguém."
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Carlos Antônio Maximino de Albuquerque (Brasil).
(Em: "O Ser Carlino", Nov-2008)
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Respeita-se a grafia brasileira.
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