sexta-feira, 23 de setembro de 2011

ANÁLISE : Marília de Dirceu por Tomás António Gonzaga

 

O livro é dividido em três partes, cada uma subdividida em liras, ou tomos. Escritos em épocas diferentes, sendo a primeira escrita antes do tempo de aprisionamento de Gonzaga em 1792, a segunda durante o tempo de prisão em 1799, e a terceira, considerada por alguns apócrifa, não tem data específica. Alguns autores creditam-na a 1812, a partir da Impressão Régia.

O livro é sobre um admirador, Dirceu, de uma mulher, Marília, e como o autor a considera. Na verdade é uma retratação dum fato real: Tomás António Gonzaga apaixonara-se por uma mulher, Maria Dorotéa Joaquina de Seixas, após ser exilado em Moçambique, e escreve poemas na qual ele a imagina. Infelizmente acaba por esquecê-la e se casa na nova pátria africana.

Na primeira parte tem-se a adoração, descrição e estipulação da relação entre o autor e a correspondente. São 23 liras de diferentes formas de poesia, métrica e rimas. O autor exibe sinais da característica primária do Arcadismo, o Bucolismo, no qual volta-se às raízes pastoris da cultura. Percebe-se isso primariamente pelo uso de Pastor e Pastora para se relacionar a Dirceu e a Marília. Também temos algumas características pré-românticas, pois temos a idealização da mulher de acordo com padrões europeus. Exemplo (I, 2):

Os seus compridos cabelos,
Que sobre as costas ondeiam,
São que os de Apolo mais belos;
Mas de loura cor não são.
Têm a cor da negra noite;
E com o branco do rosto
Fazem, Marília, um composto
Da mais formosa união.
 

Tem redonda, e lisa testa,
Arqueadas sobrancelhas;
A voz meiga, a vista honesta,
E seus olhos são uns sóis.
Aqui vence Amor ao Céu,
Que no dia luminoso
O Céu tem um Sol formoso,
E o travesso Amor tem dois.
 

Na sua face mimosa,
Marília, estão misturadas
Purpúreas folhas de rosa,
Brancas folhas de jasmim.
Dos rubins mais preciosos
Os seus beiços são formados;
Os seus dentes delicados
São pedaços de marfim.

Aqui percebe-se as características européias da mulher, (pele branca como a neve e lábios bem vermelhos e definidos) que tanto se refere no Romantismo. O Arcadismo é, por muitos, considerado apenas uma transição entre o Barroco e o Romantismo, pois é composto, na maior parte, por aspectos do que se tornaria o Romantismo.
Minha análise da primeira parte se resume em apontar as características árcades (Bucolismo, métrica/rima, ótica mitológica (I, 8)) e as características pré-românticas (idealização da mulher).

Na segunda parte, temos uma maior influência das características pré-românticas, principalmente a tristeza e a chateação (Mal-do-Século). Gonzaga sofre esse Mal-Do-Século por estar longe de sua amada e não poder se relacionar com ela por estar preso. Há a predominância do tempo pretérito imperfeito e do modo subjuntivo, no qual o autor reclama do que não fez antes de ser preso e do que poderia ter feito.

Minha análise da segunda parte resume-se ao apontamento do Mal-Do-Século e da mudança no modo de escrever, pois não há mais a mesma importância com a métrica/rima como na primeira parte.

A terceira parte, como acima mencionado, considerada por muitos apócrifa, não só por não ter data correta de edição, mas também por haver uma parte escrita apenas em sonetos, que não era o estilo de Gonzaga, que mudava o modo de escrever a cada lira. Nesta parte também se percebe o distanciamento de Dirceu com Marília. Talvez por ter encontrado um amor em Moçambique ou pela edição ser realmente apócrifa. Mas de qualquer forma, não se tem mais o Mal-Do-Século nem o Bucolismo. Tem-se as vezes até um pouco de pedantismo ao se referir à ótica mitológica, imitando a primeira parte. (cf. III, 1 e 2).

Minha análise da parte três se resume em concordar com outros autores como sendo apócrifa, pois difere em muitos pontos da poesia de Gonzaga nas duas primeiras partes. No entanto, se realmente for de Gonzaga, pode-se perceber que as características Neo-Classicistas do Arcadismo são proeminentes.

Tendo em vista a primeira parte e a segunda como as principais, pode-se identificar quem, em que época e como foi escrito o livro.

O livro, considerado o ápice do Arcadismo por alguns autores, realmente expõe as principais características transacionais do Arcadismo entre o Barroco e o Romantismo.

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