terça-feira, 24 de janeiro de 2012

BOSCH : Muito além das tentações

Em As Tentações de Santo Antão Hieronymus Bosch retrata os episódios das tentações de Santo Antão, o príncipe dos eremitas. Na obra, podem-se ver diversas cenas que, segundo constam nas hagiografias que tratam da vida do santo, são passagens em que o eremita é atormentado pelo diabo e seus companheiros, que estão representados nas diversas figuras grotescas que estão ao redor do santo.
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As Tentações de Santo Antão é uma das obras-primas de Hieronymus Bosch, célebre pintor holandês famoso pela inimaginável inventividade de suas criaturas grotescas e fantásticas. A obra foi realizada no século XVI (alguns historiadores concordam que seria entre 1500 e 1505), quando o Renascimento já florescia na Europa. No entanto, trata-se de um documento que coloca em evidência o imaginário medieval - o maravilhoso e o fantástico - ainda presente entre a população européia.


Bosch retrata com uma estética fantástica e grotesca, em As Tentações de Santo Antão, os episódios da vida do santo em que Antão é perseguido e golpeado por uma legião de demônios mandados pelo diabo para o tentarem. As hagiografias do santo contam que o diabo estava furioso com o eremita por que ele havia doado todos os seus bens e se mudado para o deserto para se dedicar à vida monástica. Santo Antão (251-356) foi o fundador da vida monástica e era um dos santos mais admirados e próximos do povo na Idade Média.

Popular na Idade Média, Santo Antão era protetor de um mal conhecido como Fogo de Santo Antão (também conhecido por ergotismo, sífilis ou ignis sacer). "O Príncipe dos Eremitas”, como chamavam o santo, era o favorito do duque de Borgonha - Felipe, o Belo (admirador de Bosch, a quem alguns estudiosos atribuem, sem provas, a encomenda da obra), que reinava sobre os Países baixos à época, fim do século XV e início do século XVI, e era admirado pelos monges que o chamavam ‘amigo de Deus’.


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Em As Tentações de Santo Antão Bosch recorre à linguagem teatral para compor as cenas dos episódios das tentações. A pintura na Idade Média tinha uma forte ligação com o teatro, era uma das principais formas de manifestação cultural na época medieval. ‘O teatro representa todos os cenários ao mesmo tempo; é uma imagem resumida do mundo’(Petit de Julleville). Bosch compõe uma alegoria da sociedade da época e com o grotesco subverte o tema da tentação. Expõe os vícios e a corrupção da nobreza e revela-nos uma Igreja corrompida, imersa no pecado.

Bosch faz da tela um palco para a representação do tema da tentação. Como no teatro, representam-se no palco da tentação um conjunto de personagens que são tipos sociais (alegóricos), personagens do cotidiano da vida pública da cidade medieval, incluindo-se as minorias (os menestréis, os jograis dos autos sacramentais do teatro medieval, figuras populares de grande mobilidade, transgressores, não fixos, mutáveis, vistos com desconfiança, por isso mesmo, pela Igreja).

As figuras grotescas de Bosch compõem cenas independentes de caráter moralizante e reflexivo. A obra de Bosch, como o teatro de sua época, é uma reflexão moralizadora da realidade, uma reflexão sobre os costumes, sobre a própria vida, em que real e imaginário se confundem e o palco apresenta-se como uma extensão da vida, em que os personagens do universo do sagrado e mitológico, do surreal, não são senão alegorias que apresentam um retrato da condição humana e da corrupção do clero em sua época e evidenciam uma sociedade imersa no pecado sujeita às tentações.

Existem diversas versões de As Tentações de Santo Antão. Além do tríptico que encontra-se no Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, há um painel que faz parte do acervo permanente do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP) e outro painel pertencente à Fundação Barnes de Merion, na Pensilvânia, nos Estados Unidos. Essas três versões são consideradas de autoria de Bosch (ou de seu ateliêr).


Leia mais: http://lounge.obviousmag.org/

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